O Blog da Faculdade Única entrevistou Eliete Magalhães – a tia Nete – que deu lições sobre a Alfabetização Baseada na Ciência, e ainda contou um pouco sobre sua vivência durante uma capacitação de seis semanas na Europa
Por Juliany Rigueira
Jornalista especializada em Comunicação Empresarial e Marketing
Alfabetização: essa palavra de seis sílabas aloja o processo de aprendizagem onde se desenvolve a habilidade de ler e escrever. É inegável que a aquisição destas duas competências desde o início da trajetória escolar se faz fundamental para a formação do indivíduo – bem como para a reversão de quadros como o do Brasil, que tem entre seus maiores desafios político-educacionais a alfabetização.
Nesse contexto, o Governo Federal, por meio da Política Nacional de Alfabetização, desenvolveu um projeto que é responsável por inserir o país no rol das federações que escolheram a ciência como fundamento para a elaboração de suas políticas públicas de alfabetização, levando para a sala de aula os “achados” das ciências cognitivas e promovendo práticas mais eficazes.
A fim de criar melhores condições para o ensino e para a aprendijçjjzagem, em novembro do ano passado 100 professores da educação básica brasileira participaram do Programa de Desenvolvimento Profissional de Professores Alfabetizadores em Portugal. Os professores participantes foram escolhidos por meio de um processo seletivo que reuniu mais de 10 mil educadores em todo o país, sendo que cada participante enviou dois projetos para serem apreciados. A professora da rede municipal de ensino de Ipatinga, Eliete Magalhães, também conhecida como Tia Nete, foi uma das selecionadas para participar do curso, que durou seis semanas. Ela é formada em Letras e em Pedagogia e é especialista em Avaliação e Intervenção na Perturbação Específica da Aprendizagem da Leitura.
A capacitação foi fruto de um acordo celebrado entre a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior/CAPES, a então Secretaria de Alfabetização do Ministério da Educação/Sealf e duas instituições portuguesas: a Universidade do Porto e o Instituto Politécnico do Porto. Entre outras coisas, o curso visou preparar professores que assim como Eliete também trabalham com alfabetização.
Ciente de que as escolas que tiverem profissionais capacitados pela Alfabetização Baseada na Ciência serão escolas com um grande diferencial, Tia Nete concedeu entrevista para o Blog da Faculdade Única e garantiu que pretende partilhar todo o conhecimento por ela adquirido.
Multiplicando o Saber
Faz tempo que tia Nete embarcou na viagem infinita de ensinar, e desde que retornou da capacitação em Portugal ela alimenta uma certeza: quer multiplicar o que aprendeu com outros educadores. “Desejo formar bons professores. Desejo multiplicar o que eu aprendi. A Alfabetização Baseada na Ciência é uma instrução que já faço na minha prática e que tenho certeza que funciona”, afirma, para continuar: “É bem comum chegar nas escolas públicas e encontrar alunos no 4º e 5º ano que não aprenderam ler e nem escrever. E hoje eu afirmo que 90% dos alunos que chegam no 5º ano sem estar alfabetizados, se dão por falta de profissionais capacitados que instruam os seus alunos corretamente, sendo necessário conhecer como o cérebro aprende e se desenvolve para assim, intervir nele. Quando o cérebro cresce e aprende ele cria conexões entre diferentes partes do cérebro e tais conexões vão sendo fortalecidas a medida que o comportamento é repetido e melhorado. Porém, se o nível de conhecimento do professor for insuficiente, a respeito de como ensinar corretamente a criança ler e escrever, não tem como o cérebro criar essas conexões e nem tão pouco tais conexões serem reforçadas, que são tão necessárias para tornar o processo de leitura automático na vida da criança”. E continuou: “pesquisas mostram que quando as crianças experimentam o sucesso no início da vida escolar, dificilmente encontram dificuldades no processo, porque sabemos que o aprendizado é como uma construção, deve-se começar pela base. Uma base sólida e bem construída não ficará lacunas, mas para isso, essa base precisa ser bem fundamentada no início do processo. Contudo, a minha pretensão é formar bons professores e contribuir para melhorar a educação no Brasil, que é tão precária nesta fase inicial do aprendizado e que culmina comprometendo todo o percurso vindouro”, disse.
Acompanhe a seguir a entrevista na íntegra:
Eliete, nos conte como você se encontrou na alfabetização?
Eliete Magalhães – eu tive um encontro com a alfabetização ainda na minha infância, aos 7 anos de idade eu pude experimentar como é difícil aprender ler e escrever e esse processo se torna ainda mais difícil quando o professor utiliza métodos ineficazes. Quando eu resolvi cursar pedagogia eu percebi que a minha essência estava ali, porém ao término da graduação assim, como todos os professores eu também não tinha uma receita pronta de como ensinar o meu aluno ler e escrever. Entretanto, devido a experiência que eu vivi lá na minha infância ao ser alfabetizada, eu cheguei na sala de aula e sabia exatamente o que fazer e como fazer. No meu primeiro ano de experiência eu alfabetizei todos os meus alunos. Alguns anos depois uma colega de trabalho me perguntou qual seria o segredo de ensinar todos os alunos ao mesmo passo ler e escrever. No momento eu não tive resposta para ela, realmente eu não sabia teoricamente o porquê dava tão certo, foi então que eu resolvi estudar muito para responder aquela pergunta e descobrir por meio dos estudos que toda a minha prática tem uma vasta fundamentação teórica.
Em novembro e dezembro do ano passado você esteve em Portugal participando de um curso na Universidade do Porto. Como foi? Conte um pouco para a gente.
Eliete Magalhães – No início de 2022, eu participei de um processo seletivo com mais de 10 mil inscritos, para estudar na Universidade do Porto em Portugal e fazer o curso Alfabetização Baseada na Ciência.
Era obrigatório escrever dois projetos, sendo um deles voltado para a prática na sala de aula com alunos e o outro para formação de professores. E os meus projetos foram selecionados. Em Portugal com uma rotina intensa de estudos, doze horas de aulas por dia, com professores que dedicaram a vida em pesquisas para estudar como a criança aprende, eu tive o privilégio de apresentar os meus dois projetos para uma bancada de especialistas e tudo o que eu estudei e presenciei só reforçou ainda mais a minha prática na sala de aula.
Ficamos sabendo que os seus projetos foram selecionados para serem apresentados aos outros professores durante a capacitação. Como isso ocorreu?
Eliete Magalhães – Todos os professores selecionados para ingressar neste curso em Portugal, escreveram obrigatoriamente dois projetos. Durante a formação os projetos foram analisados e alguns escolhidos para serem apresentados numa banca aos olhos atentos dos especialistas. Os projetos escolhidos tinham que estar bem alinhados com a proposta do curso Alfabetização Baseada na Ciência e durante as tutorias muitos professores tiveram que modificar os seus projetos e apresentar um ou outro, porém eu fui escolhida para apresentar os meus dois projetos, sem nenhuma alteração, apresentei na íntegra toda a minha prática da sala de aula.
Fale para a gente um pouco sobre a Alfabetização Baseada na Ciência e a sua importância para a formação do indivíduo.
Eliete Magalhães – Quando falo sobre Alfabetização Baseada na Ciência não me refiro a uma teoria a mais e sim, o que de fato a ciência tem comprovado por meio de experimentos de larga escala e pela ativação cerebral em respostas aos estímulos, visto através de equipamentos tecnológicos em tempo real. Toda a descoberta de como o cérebro aprende, como as crianças se desenvolvem vai influenciar diretamente no método utilizado pelo professor na sala de aula e isso, fará muita diferença nos resultados que o professor deseja alcançar.
Temos em nossos cursos de pós-graduação vários pedagogos recém formados que buscam dicas para se destacarem na profissão. O que você diria para uma pessoa que está iniciando no mercado de trabalho?
Eliete Magalhães – Quando concluímos a graduação nenhum de nós saímos com uma receita pronta de como alfabetizar os alunos, pelo contrário, chegamos na sala e nos deparamos com uma realidade bem diferente. Salas de aula com grupos heterogêneos e com àqueles que marcham de uma forma mais lenta, que apresentam mais dificuldades no processo, e é nesta hora que o professor precisa saber intervir, porque a medida que o ensino acontece essa distância, essa heterogeneidade aumenta de um aluno para o outro. Se o professor não intervir de imediato, dificilmente ele conseguirá recuperar este aluno, visto que depois soma-se a dificuldade no aprendizado com as questões emocionais, que geram por sua vez a desmotivação e baixo autoestima. A consequência deste processo mal realizado nós sabemos: indisciplina e futuramente evasão escolar.
Os pedagogos estão constantemente buscando por estratégias eficazes para que as crianças aprendam a ler e escrever. Qual a sua visão sobre essa incansável busca pelo conhecimento?
Eliete Magalhães – É muito importante que os docentes busquem o conhecimento apropriado. Sabemos que hoje com o avanço tecnológico muitas descobertas foram feitas pela neurociência cognitiva e isso, pode auxiliar muito os professores na sala de aula. É importante conhecer e entender como a aprendizado acontece, como o aluno aprende, para que a partir de então, possam intervir com práticas significativas.
Tome Nota:
A professora Eliete Magalhães – Tia Nete – compartilha em suas redes sociais os seus conhecimentos, relatando experiências e saberes produzidos no chão da escola. Vale (muito!) acompanhá-la!
Instagram: @prof.elietemagalhaes
Youtube: Eliete Magalhaes – ABEC